Texto escrito pelo Prof. Gustavo Marichal, responsável pela disciplina de Geografia do 8º e 9º anos do ensino fundamental II. O professor Gustavo é bacharel e licenciado em Geografia pela Universidade de São Paulo. Neste texto, Gustavo nos apresenta sua observação sobre o escritor Eduardo Galeano e seu diversos escritos: crônicas, contos, poemas, microrrelatos, entre outros, além de contextualizá-lo com os dias atuais.
E os dias se puseram a andar.
E eles, os dias, nos fizeram.
E assim fomos nascidos nós,
os filhos dos dias,
os averiguadores,
os buscadores da vida.
(Gênesis, de acordo com os maias)¹
O amigo leitor já ouviu falar do escritor uruguaio, já saudoso, Eduardo Galeano?
Segundo sua idade, é provável que o leitor cite um best-seller famoso, As veias abertas da América Latina, publicado em 1971 e que lhe rendeu algumas proibições: seu livro foi proibido na Argentina, Chile, Uruguai e Brasil, sendo que eventualmente ele próprio foi proibido de ficar em seu país-natal, tendo que partir para o exílio, na Espanha. Pode ser, por outro lado, que o leitor lembre de um vídeo famoso, sobre a utopia, em que ele aparece relatando a resposta dada por um amigo, o diretor argentino diretor Fernando Birri, durante uma palestra, em que um estudante indaga a respeito da função da utopia. Popularizada na voz de Galeano, a resposta indica que ela, a utopia, se afasta à medida que tentamos nos aproximar dela e que essa seria sua função: nos ajudar a caminhar.
Talvez, os mais jovens e antenados à produção musical latina, saberão que sua voz abre o álbum, e convida às reflexões, do Multiviral, álbum do grupo porto-riquenho Calle 13, que colecionou de indicações a prêmios ligados à música, tendo ganho o Grammy de 2015 de "Melhor Álbum de Rock, Urbano ou Alternativo Latino", a elogios do público em geral.
As veias... é o livro mais famoso do autor, sendo que ele consolida o momento histórico em que as respectivas ideias circulavam e foram postas no papel, servindo para entender como estavam as ideias da esquerda em tal período. O mundo mudou, tornou-se mais complexo, e talvez a capacidade do livro em explicar o mundo esteja um pouco defasada. O autor também mudou: a obra de Galeano é tão ou mais completa que seu best seller - tanto que ele chegou a declarar, década passada, que seria incapaz de ler tal livro novamente.
Suas crônicas ajudam a construir imagens e paisagens por meio de todo tipo de relatos: de pichações profundamente reflexivas (como "Eu nos amo", vista em Valparaíso), a anúncios chocantes (como o de venda de mão de obra escravizada, durante o século XIX), a relatos do choque cultural entre europeus e ameríndios (religião, costumes e até mesmo idiomas que se foram). Essas crônicas, presentes em O livro dos abraços, de 1991, ajudam nas aulas, sobretudo as que abordam a América Latina, à medida que sua obra permite um sem-número de possibilidades de discussão, ajustando-se a várias discussões junto aos alunos.
Uma forma de tentar entendê-lo (e rotulá-lo, ainda que não se queira) seria associá-lo a um tipo de testemunha da vida, um caçador de histórias². Federico Garcia Lorca, uma vez escreveu, em um discurso para uma inauguração de biblioteca, dime que lees y te diré quien eres. Toma-se a licença para ajustar tal frase ao Galeano, que sempre escreveu sobre invisíveis: as minorias, as ideias e as ações por meio de contos, poemas, crônicas e microrrelatos. Assim, dá voz àqueles que usualmente não são protagonistas, sendo esquecidos pelo andar da história, mas que também desempenham relevante papel. Por exemplo, é preciosíssima a sua reflexão sobre os egípcios antigos que, anônimos, ergueram as pirâmides, ainda que a História tenda a falar dos faraós que ordenaram tais obras.
Galeano se deu o direito de sonhar, se deu o direito ao delírio, se deu direito ao diálogo. Aliás, é impossível pensar a educação sem o diálogo, sem a troca de ideias, sem que visões de mundo sejam compartilhadas. Com isso, permite o mesmo aos seus leitores, que apreciando suas palavras, têm a possibilidade de imaginar. Aliás, sobre a interação entre a visão de nativos e a ocidental, vale a pena citar a reflexão vinda de uma crônica, também presente em Os filhos dos dias, sobre Ângela Loij, uma das últimas indígenas onas da Terra do Fogo, e a última que falava sua língua, cantando para ninguém canções que ninguém mais lembrava. O deus supremo dos onas se chamava Pemaulk.
Pemaulk significa palavra.
Na juventude li Galeano e tantos outros autores esquerdistas (escritos de Dom Paulo Evaristo Arns e "Brasil Nunca Mais", Drumond, Dom Helder Câmara, Perseu Abramo, Florestan etc.).
Parafraseando o professor, "é uma espécie de gonorréia juvenil, a qual todos estávamos expostos, passado um tempo, ela se curou com o contato com a realidade".
Ocorre que se trata de uma visão pessimista da história que desperta no leitor (pelo menos despertou neste que vos fala) sentimentos de vingança contra o "sistema capitalista malvado", sobretudo quando não contraposta a outras leituras.
Por isso, também acredito na pluralidade do ensino, deve-se abordar os autores conservadores (São Tomás de Aquino, Chesterton, Hugo de S. Vitor, Olavo de Carvalho) e liberais (Mises, Sowell, Friedman) na…
Sugiro abordar autores como Ludwig Von Mises também. É importante que as crianças tenham várias visões de vida, fica difícil se manter somente na esquerda anticapitalista.